I. Para o domingo

Do fim do homem

Considera, minha alma, que o ser que tens, te foi dado por Deus, quando te criou à sua imagem, sem nenhum merecimento teu; adotou-te por filho no santo batismo, amou-te ainda mais do que um pai, e criou-te para que o amasse e servisse nesta vida, para depois o paraíso. Não nascestes, portanto, nem deves viver parar a terra, para juntar riquezas e ser poderoso, nem para comer, beber e dormir, como os brutos, mas só para amares ao teu Deus e te salvares eternamente. E as coisas criadas deu-te o Senhor para te ajudar a conseguir o teu grande fim.

Ah! Infeliz de mim, que tenho passado a vida a pensar e cuidar de muitas coisas, menos do meu fim!. Meu Deus, Pai de misericórdia, fazei que eu comece uma vida nova, toda santa e conforme a vossa vontade.

Considera como, na hora da morte, hás de sentir grandes remorsos de não teres aplicado a servir a Deus. Que pena para ti, quando, no termo da tua vida, advertires que já te não resta mais naquela hora todas as grandezas, glórias e prazeres, senão amargosíssima recordação! Então hás de espantar-te de, por vaidades e bagatelas, teres perdido a graça de Deus e a tua alma sem já teres tempo de repares o mal feito e de te pores no bom caminho. Então é que hás de conhecer s preciosidade do tempo, mas já será tarde; quererias comprá-lo com sangue, mas não o poderás fazer. Oh! Desespero! Oh! Tormento! Oh! Dia amargo para quem não serviu a e amou seu Deus.

Considera ainda quanto é geralmente descurado este grande fim. Pensa-se em comer, em folgar, em passar os dias em prazeres e divertimentos, e não se pensa em servir a Deus e salvara a alma, e tem-se em pouca coisa o eterno fim para que fomos criados. E por este modo a maior parte dos cristãos vai caminhando para o inferno banqueteando-se, cantando e dançando. Oh! se eles soubessem o que quer dizer o inferno! Oh! Homem, fazes tanto para te condenar, e nada fazes para te salvar!

Estava a expirar um secretário do rei Francisco, rei da França, e dizia: Desgraçado de mim! Gastei tanto papel em escrever cartas do meu príncipe, e não tive uma folha para recordar-me dos meus pecados e fazer uma boa confissão!..Filipe III, rei da Espanha, dizia quando estava moribundo: Oh!, não tivera eu nunca sido rei!

Porém, de que servem estes suspiros e estas lamentações? Servem para maior desespero. Aprende tu, à custa dos outros, a viver solicito da tua salvação, se não queres cair na mesma desgraça. E, sabe que quanto fazes, dizes e pensas fora do que é do agrado de Deus, tudo é perdido. Vamos, pois, já é tempo de mudares de vida.Queres esperar pelo dia da morte para te desenganares? A porta da eternidade, sobre o limiar do inferno, quando já não há tempo para emendar o erro?

Meu Deus, perdoai-me.Eu vos amo mais que tudo.

Eu me arrependo de vos ter ofendido, e protesto daqui em diante mar-vos e servir-vos com todo o meu coração e com toda a firmeza de minha vontade, auxiliado pela vossa graça.

Fruto:

Quando fores tentado, levanta os olhos ao céu, implora o socorro divino e diz: Quero salvar-me.São Luiz quando ouvia falar em coisas temporais, dizia: E de que serve isto para a eternidade?

Se não serve para a eternidade, importa pouco.

Considera bem que tudo acaba, e a eternidade nunca acabará... Minha alma, que eternidade será a tua? O céu ou o inferno?